19 de set. de 2007

Disfarce

Sexta-feira, dezenove horas e vinte e três minutos. Ela sabia que o telefone não iria tocar. Mesmo assim, estava ali sentada ao seu lado, esperando. O cigarro que fumava estava na metade, era o terceiro. As tragadas cada vez mais profundas. Ver a fumaça subir espiralada a acalmava. Aumentou o volume do som. Nobody said it was easy. Adorava aquela música. No one ever said it would be this hard.
[Duas batidas com o cigarro na borda do cinzeiro. Cinzas caindo.] Outra tragada. Ela gostava do cigarro entre seus dedos. Queria os olhares voltados para si quando fazia isso. Gostava de olhares, daqueles principalmente. O telefone não tocava. Não iria tocar. Mas ela continuava ali.
O sofá preto, a pequena mesa, os livros. Enquanto corria a mão suavemente sobre seus próprios cabelos ela devaneava. Queria sair, ver o mundo, ir para qualquer lugar novo e excitante. Para longe. Fugir do vazio que escondia dentro. O telefone não tocava. Ele parecia ser tão diferente. Era seguro. O único capaz ainda de lançá-la ao abismo e, em um piscar de olhos, salvá-la apenas estendendo-lhe a mão.
Ela definitivamente era uma femme comme il fault, porém, frágil. Concentrava a segurança daqueles que sabem encenar bem a si mesmos com o profundo desamparo de quem se vê desprotegida. O papel exigia destreza e habilidade. Ela parecia saber fazer leve o peso de sua personagem. [Duas batidas na borda do cinzeiro. Fumaça espiralada subindo.] O telefone não tocava.
Ela sabia o que queria. Sabia o que fazer para conseguir e, normalmente, conseguia. Mas não hoje, não com ele. Não tinha problemas em atingir objetivos, tinha apenas em defini-los. Estava sozinha e isso a incomodava muito. A falta de espectadores lhe obrigava a ver a si mesma. Ela queria alguém. Precisava de alguém, só para não ouvir seus próprios ecos. Era frágil. E, por isso, prepotente. Estava sempre certa, mesmo quando errada.
Ela tinha planejado tudo. Queria vê-lo, senti-lo. Porque o maldito telefone não tocava? Lembrou-se da última conversa. Lembrou-se de como se divertiam juntos. Ela sentiu vontade de chorar. Nada fazia sentido. O vazio de dentro aumentava. Acendeu outro cigarro. [Fumaça espiralada.] Tentou esquecer. Tentou lembrar-se de outra coisa.
O telefone? Será?
Não era nada além de sua própria imaginação. Ela era frágil. Queria alguém que lhe protegesse. Mas acabava afastando qualquer um que chegasse muito perto. Não queria sofrer, por isso, sofria. Estava sozinha. Não sabia viver assim. No one ever said it would be this hard.
Gostava de parecer forte. Gostava de ser vista assim, esforçava-se para isso. Esse era seu disfarce. Parecer. Queria ser vista, mas nunca se mostrava. Não conseguia. Só o que tinha fora estava preparado, o interior não. Nem ela sabia o que escondia dentro. Sabia apenas que não era para ser exposto. Tinha medo, muito medo. Era frágil. Defendia a si mesma se escondendo. O telefone não iria tocar.
Não conseguiu conter as lágrimas.
Porque as coisas eram como eram? Porque tudo aquilo? Por quê?
Não sabia as respostas. Ninguém saberia. Chorava. Não por causa do telefone que não tocava, nem por causa do que não ligava. Chorava por si mesma. Por tudo o que não era. Por tudo o que queria. Chorava apenas. Ela que nunca mostrava qualquer fraqueza, mas era frágil, chorava.
[Fumaça. Cinzas. Tragada funda.] A maquiagem borrada. Pequenas lágrimas sobre a roupa cara. Seu cabelo agora deveria estar horrível. Ela era só uma menina. Tinha medo. Tinha sonhos. Chorava apenas. Não queria lembrar-se de que ainda estava ali. Sozinha. Não queria lembrar-se de nada. Queria esquecê-lo apenas. Arrancá-lo de si. Queria colocar tudo o que estava lá dentro para fora. Fugir. Adormecer. Queria que tudo parasse, voltar no tempo e fazer tudo diferente.
Queria ser forte.
O seu choro continuou ainda por muito tempo. Ela estava sozinha. Ela sempre estaria sozinha. O seu personagem não servia mais. O medo nervoso que tinha da dor a aproximava ainda mais dela. Sentiu o desespero de quem começa a ver a si próprio sem mistificação. Deu a última tragada. Afundou o cigarro no cinzeiro. Não havia mais a fumaça espiralada. O telefone tocou.

17 comentários:

Anônimo disse...

o tempo d fumar um cigarro as vezes é só o tempo que se precisa para entrar nos eixos

...mas fumar faz mal =/

r.farias disse...

a anciedade muitas vezes pode ser angustiante, seja o tempo de 1 cigarro ou de uma carteira completa !!
abraço

KK disse...

você disse que o telefone não iria tocar, a algumas horas atrás...

Erika disse...

Menino..oq eh esse blog hein? Muito bom..achei na comunidade do orkut, ai to comentando..tive que escolher apenas um t�pico para elogiar...mas todos s�o mto bons!!

[?] disse...

O telefone tocou, mas não foi ele que ligou...

Anônimo disse...

Roubar a historia d vida dos outos e fingir q se trata d uma ideia original é muito futil e vulgar. Tentar descrever o q se passa (ou se passou) num coração partido q não o seu é imoral. Vc quer provar q conhece alguém q vc nunca conheceu d fato, mas q se atreveu a invadir sua alma e t deixou marcado pra sempre.
Ao invés d provocar, tente fazer o bem.
Prossiga c a sua vida e para d ser apenas um mero coadjuvante da vida alheia. That´s the best you can do.
PS: Cuidado cos erros d protuguês.

Anônimo disse...

É tudo psicológico. Quem se agrada ao fumar, senti-se bem, mesmo sabendo que faz mal. Quem não se agrada, procura uma maneira diferente.

Um fumante, precisa do cigarro... de qualquer jeito.

Ótimo blog, parabéns.

Anônimo disse...

parabens, excelente texto. MUITO bem escrito.

Unknown disse...

Gostei, rapaz! Esse seu estilo de pontuação dá uma angústia tremenda no leitor! Eu senti pena da mulher...

obs: revoltada essa Scheilla, eim? E cuidado "cos erros d protuguês"! hauahauahua

Anônimo disse...

nossa muito bom!!!
adorei o seu blog
e esse post muito bom mesmo.

Anônimo disse...

Mais um texto cheio de lirismo e filosofia. Ansiedade e medo normalmente caminham juntos com a decepção..

Unknown disse...

outro arraso =)
e q final feliz =o

KK disse...

rodrigo, dá pra você tirar as propagandas do seu blog????

Anônimo disse...

reconheci muitas das minhas realidades nesse texto, mas pode ser um pouco óbvio dizer isso, afinal essa é uma história quase universal, mas cada uma tem um final diferente... anyway, belo texto!

m�fia verde disse...

nobre companheiro, preciso dizer algo? ao contrário de vc, eu tenh transparencia tanto na vida quanto no blog, ao contrário de vc, não vou apagar seus comentários ok?? como0 vc fez com o meu... e a proposito do publico q ve seu blog e qual ve o meu, eh simples. coloca um contador ai de visitas... começei o meu sabado.. tenho algumas visitinhas lah.. naum vi contador no seu.. mais seu blog eh bom vc sabe disso..

texto de internet, vc escreve muito bem ai no blog. tudo devidamente como deve ser, e quando vai ao meu blog postar, não digita com a mesma eficiencia q digita aqui.. pq será???????

obrigado pelos comentários.. continue visitando e postando ok? ah e aumentando minha audiencia, gaanho dinheiro com sua visita tambem.. desde de já

obrigado aos comentários e volte sempre. o blog tambem é seu.....

Camila Passatuto disse...

Nossa, esse texto faz um contexto legal com o q escrevi né rsrsrsrs...

um pekeno instante de sofrimento, uma crise de identidade, uma espera meio chata...tudo isso em palavras q nos prende até o final do texto...

mto bom mesmo
adorei

Anônimo disse...

...Muito bom o texto...como outros por aqui que já comentei!!!